A população prisional no estado de São Paulo vem crescendo acentuadamente nos últimos quinze anos. Se em 1992 existiam 30 670 pessoas presas distribuídas em 43 estabelecimentos penitenciários (cf. Salla, 2007), atualmente são mais de 190 mil, o que corresponde a mais de 30% do total de presos do país, distribuídos em 154 unidades prisionais, além dos dezesseis complexos ainda em construção (cf. Depen, 2012). A grande maioria desses estabelecimentos encontra-se em pequenas cidades paulistas; ao todo são 104 unidades espalhadas pelo interior do estado. O acelerado crescimento do sistema prisional é caracterizado, portanto, por uma política de descentralização das unidades e de encarceramento em massa 1 , posto que focalizado em acusados por crimes patrimoniais e drogas, jovens, homens e oriundos das periferias urbanas.Este artigo baseia-se em trabalhos de observação participante e entrevistas com atores significativos do cotidiano prisional. São abordados dois aspectos que envolvem a expansão e a gestão do sistema penitenciário, a saber: as transformações e os conflitos sociais nas dinâmicas urbanas das pequenas cidades que receberam unidades penitenciárias e a gestão de presos, que ocorre de forma peculiar, sendo compartilhada entre a administração e os internos. Tal compartilhamento se dá num plano geral das relações, que vai desde o controle dos conflitos entre moradores, familiares de presos e autoridades municipais até as ações de "tratamento penitenciário" 2 , como é o caso da política educacional. Os presos que são monitores de educação configuram um grupo diferenciado, que negocia constantemente a execução de seu trabalho tanto com a administração quanto com a organização dos presos.Ao mesmo tempo, o trânsito constante de presos e familiares pelas unidades prisionais e bairros populares propiciou a difusão dos códigos de conduta por esses espaços. As conclusões obtidas nos trabalhos aqui discutidos apontam para o reconhecimento de novas personagens nas dinâmicas prisionais. Novas personagens que acabam por se responsabilizar por tarefas de "tratamento penitenciário" delegadas formal ou informalmente, assumindo também o desempenho das normas e moralidades que hoje regem a vida nas prisões.Do ponto de vista analítico, o texto discute teses, divulgadas por estudos recentes, que se contrapõem: de um lado, a defesa da existência de uma coerência entre as políticas e os dispositivos do endurecimento penal, do tratamento e da repressão crescente, que resultaria na neutralização da garantia de direitos aos presos, recorrendo a táticas ilegais e de exceção; de outro, estudos que identificam o surgimento dos coletivos de presos como a emergência de um novo sujeito político que muda a correlação de forças na gestão cotidiana da repressão, da vigilância, da disciplina e da violência no interior das prisões e nos espaços sociais em que seus efeitos são sentidos.Diante dessas teses, a análise aqui proposta busca interpretar as dinâmicas da punição no contexto contemporâneo como efeitos de uma tensão entre esses vetores ...
This book deals with the emergence of prison management in Brazil, understanding it as an effect of forces between different orders of the penitentiary apparatus, in which the Justice and Security bundles are highlighted, based on disputes and accommodations between actors, institutions and perspectives that, within each order or in their external interactions, configure the dynamics of the Brazilian Penitentiary Administration, within which a penitentiary bureaucracy is produced, specialized in mediating the conflicts and the approximations between the orders. In recent times, these mediations also suffer the influence of a third line of force, represented by the criminal groups originating inside prisons. Traveling thousands of kilometers through prisons, suburbs, government palaces and courtroom hallways, the study describes the constant updating of the brazilian penitentiary apparatus, which operates with the goal of ensuring it's reproduction by different strategies of accomodation of Law resulting from the preponderance of Security in the correlation of forces, which manifests in the composition, the functioning, the characterization and the processes of professional formation of the penitentiarist bureaucracy, comprehended as a diffuse and fragmented body that, far from characterizing a rationalization of the prison system, manifests itself, above all, as a government mentality.
VOLUME 3 / NÚMERO 1 (JANEIRO / JUNHO – 2014)
No presente artigo, relato três momentos na trajetória de Diego, desde a construção de sua sociabilidade no sistema penal, passando pela progressão ao regime aberto e culminando em seu retorno à privação de liberdade. Este percurso etnográfico tem por objetivo refletir sobre algumas questões que são debatidas no campo da sociologia da violência, especialmente as tensões entre a função social da prisão, a"reintegração social" de presos e a "falência" do sistema prisional. Retomando um breve percurso interpretativo acerca da violência e da punição nas teorias sociológicas, o texto aponta para um alinhamento entre a trajetória de Diego e as concepções multidimensionais da prisão, destacando as formas de sociabilidade que dela – e nela – se originam.
ResumoRetomando um breve percurso histórico acerca da oferta de educação para as pessoas em privação de liberdade em estabelecimentos penais, este artigo descreve alguns conflitos e negociações presentes no Programa de Educação nas Prisões de São Paulo, Brasil, executado pela Funap -Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel, entre os anos de 2004 e 2012. Baseado em coleta de dados junto a diferentes sujeitos que interagem neste programa e numa inserção direta do autor no sistema prisional paulista, o texto aponta o monitor preso de educação, uma identidade social forjada no seio das relações sociais estabelecidas nas prisões de São Paulo, como ponto de inflexão paradoxal entre práticas penais supostamente antagônicas que coexistem nos estabelecimentos prisionais e que influenciam todas as relações sociais ali estabelecidas, determinando as políticas e as estratégias que constituem aquele Programa. Assim, ao invés de serem compreendidas segundo a premissa do "endurecimento penal", por um lado, ou consideradas como práticas de "reintegração social", por outro, tais políticas e estratégias se harmonizam conflitualmente, reforçando a reprodução da prisão como modo privilegiado de punição, o que é facilmente percebido pelo crescimento contínuo e acentuado do sistema prisional paulista. O artigo complementa conclusões obtidas durante pesquisa de mestrado em sociologia, dando sequência a alguns dados anteriormente apontados.Palavras-chave: práticas penais; educação nas prisões de São Paulo; monitor preso de educação; Funap. AbstractResuming a brief history about the provision of education to people deprived of their freedom in prisons, this article describes some conflicts and negotiations present in the Programa de Educação nas Prisões de São Paulo (Education Program in the Prisons of São Paulo State, Brazil) run by Funap -Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel, from 2004to 2012. Based on data collection from the different subjects that interact in this program and a direct insertion of the author in São Paulo prison system, the text presents the inmate education monitor, a social identity forged within the social relations established in Sao Paulo prisons, as a paradoxical inflection point between supposedly antagonistic criminal practices that coexist in prisons and that influence all social relationships established therein, determining policies and strategies that constitute that Program, which is easily perceived by the continued growth of São Paulo prison system. The article complements findings obtained during a master's research in sociology, providing some new data.
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