Francisco Fonseca Mídia, poder e democracia: teoria e práxis dos meios de comunicaçãoOs conflitos sociais, das mais variadas ordens, são possibilitados na democracia pelas instituições e pelas normas legais, assim como pelos pactos entre as classes sociais. Nesse sentido, não deixa de ser um truísmo a constatação de que, independentemente da forma e do sistema de governo uma democracia só poderá assim ser considerada se na esfera pública os diversos interesses puderem se manifestar: por esfera pública entendemos a arena em que se mesclam interessem comuns e de classes, "comuns" quanto à lógica da Nação, da identidade nacional, do Estado nacional, e "de classes" no que tange a interesses sociais imanentemente distintos, embora possam, em determinadas conjunturas e dependendo dos arranjos políticos, se assemelharem (Offe, 1984).Considerando que essa premissa não necessita ser aprofundada, é fato que a mídia -entendida como o complexo de meios de comunicação que envolve mensagem e recepção, por formas diversas, cuja manipulação dos elementos simbólicos é sua característica central (Eagleton, 1991) -representa uma forma de poder que, nas sociedades "de massa", possui papéis extremamente significativos, tais como: influir na formação das agendas públicas e governamentais; intermediar relações sociais entre grupos distintos (Capelato, 1988); influenciar a opinião de inúmeras pessoas sobre temas específicos; participar das contendas políticas, em sentido lato (defesa ou veto de uma causa, por exemplo) e estrito (apoio a governos, partidos ou candidatos); e atuar como Revista Brasileira de Ciência Política, nº 6. Brasília, julho -dezembro de 2011, pp. 41-69. Francisco Fonseca"aparelhos ideológicos" 1 capazes de organizar interesses. Quanto a esses, em determinadas circunstâncias atuam à guisa de "partidos políticos" ou "intelectuais coletivos e orgânicos" de grupos específicos (Coutinho, 1994). Esses papéis são ocultados sob o lema do "dever da informação", que seria "neutra", "independente", "apartidária" e "a-ideológica", características invariavelmente alegadas pelos órgãos da mídia ao retratar, de forma cabotina, sua atuação.Dessa forma, a mídia, ao participar da esfera pública como "prestadora de serviços", isto é, como entidades de "comunicação social", teria uma função imprescindível nas democracias: informar sobre os acontecimentos levando às pessoas uma gama de dados que, sem esse serviço, não teriam condição de conhecer outras realidades que não as vivenciadas ou relatadas por pessoas próximas 2 . Mais importante, os órgãos da mídia fariam a fiscalização do Estado, exercendo assim a forma mais bem acabada de "controle social": em relação ao dinheiro público, às ações públicas, numa palavra, aos negócios públicos.Note-se, contudo, que os órgãos da mídia -emissoras de tv, rádios, jornais, revistas, portais -atuantes na esfera pública são em larga medida empresas privadas que, como tal, objetivam o lucro e agem segundo a lógica e os interesses privados dos grupos que representam. Embora a ação da mídia seja compl...
ResumoEste artigo elabora reflexão crítica, em forma de ensaio, sobre algumas dimensões negligenciadas ou pouco desenvolvidas nas principais abordagens teóricas das "políticas públicas". Metodologicamente, questões conceituais são articuladas ao debate público, a começar pela própria revisão do termo "política pública". Conclui-se que questões como o papel do conflito, de naturezas variadas; dos constrangimentos advindos do modelo de acumulação capitalista e do sistema político (brasileiro, no caso) quanto à efetivação de reformas transformadoras; e do poder de veto da mídia e de outros atores devem ser revalorizados e ressignificados, com vistas a uma interpretação mais profícua do papel das "políticas públicas". Particularmente, essas dimensões podem contribuir para a compreensão das "políticas públicas" na sociedade brasileira: suas características, funções e impactos. Palavras AbstractThis article is a critical reflection, in essay form, about some dimensions neglected or poorly developed in the main theoretical approaches of "public policies". Methodologically, conceptual issues are related to the public debate, starting from the review of the term "public policy" itself. We conclude that issues such as the role of conflict, with various natures; the constraints due to the capitalist accumulation model and the political system (the Brazilian, in this case) with regard to the effectuation of transformative reforms; and the veto power of mass media and other actors must be revalued and resignified, aiming at a more fruitful interpretation of the role of "public policies". Particularly, these dimensions may contribute to the understanding of "public policies" in the Brazilian society: their characteristics, functions, and impacts.Keywords: Public Policies. Critical Dimensions. Public Debate. Conflicts. Veto Power. IntroduçãoAs práticas governamentais e o debate acadêmico contemporâneos têm sido marcados pela predominância e difusão de um conceito amplo, fugidio e pouco fundamentado: o de "políticas públicas". Interpretado teoricamente de variadas formas e, por vezes contrastantes, e apercebido social e politicamente com sentidos (e expectativas) distintos, tal conceito necessita de reflexão crítica para que se tenha exata noção sobre o que ele representa e qual seu papel e impacto na sociedade.Artigo submetido em 22 de maio de 2013 e aceito para publicação em 03 de setembro de 2013.
Democracia e participação no Brasil: descentralização e cidadania face ao capitalismo contemporâneoResumo: Este artigo analisa duas tradições opostas quanto aos conceitos de 'descentralização' e de 'poder local' (o pensamento social brasileiro e a matriz advinda de Tocqueville) em razão do papel concedido a tais conceitos pela Constituição de 1988, pois tidos como capazes de viabilizar a participação democrática após o fim da ditadura militar. Em contraste, analisa-se como o arranjo brasileiro pró-democracia e participação vem sendo reconfigurado pela terceira revolução industrial, que flexibiliza e precariza as relações econômicas e sociais em prol do capital. Especificamente, examina-se a resposta política (em sentido amplo) do Estado brasileiro -via políticas públicas de saúde, notadamente o SUS -a esse choque de forças contrárias. Observa-se também como aspectos federativos relacionados ao SUS permitem compreender a dinâmica da democracia, da participação e da cidadania (em várias dimensões) no Brasil. Palavras-chave: democracia, participação, descentralização, capitalismo, cidadania. Democracy and Participation in Brazil: Decentralization and Citizenship in Contemporary CapitalismAbstract: This article analyzes two opposite traditions in relation to the concepts of "decentralization" and "local power" (Brazilian social thinking and the Tocqueville based matrix) due to the role given to these concepts by the Brazilian Constitution of 1988. These concepts were considered capable of making viable democratic participation after the end of the military dictatorship. It also analyzes how the Brazilian pro-democracy arrangement and participation has been reconfigured by the third industrial revolution, which the economic and social relations that sustain capital more flexible and precarious. Specifically, it examines the political response (in a broad sense) of the Brazilian state -via public health policies, notably the Single Healthcare System (SUS) -to this clash of conflicting forces. It also observes how federative factors related to SUS allow understanding the dynamics of democracy, participation and citizenship (in various dimensions) in Brazil.
Este trabalho pretende demonstrar as falsas confluências do papel da mídia em relação à democracia e às teorias políticas acerca da democracia. Para tanto, procura-se refletir criticamente sobre os argumentos: a) que naturalizam o fato de a notícia ser uma mercadoria, b) voltados aos (supostos) fins públicos da mídia, embora seus órgãos sejam em larga medida privados e c) que vinculam esses órgãos aos valores liberal-democráticos. Assim, o texto procura demonstrar ao mesmo tempo a ausência e a necessidade de anteparos - consubstanciados na teoria dos freios e contrapesos - aos poderes constituídos, sobretudo da mídia; apontar o paradoxo da intermediação entre as esferas pública e privada realizada pela mídia e questionar até que ponto a mídia realiza a idéia de que quem controla deve ser controlado, sobretudo em um mundo em que as comunicações ampliaram sua atuação para dimensões planetárias. Conclui-se que a democracia somente poderá efetivar-se caso haja controles democráticos sobretudo sobre a mídia, assim como urge criarem-se, em escalas nacional e internacional, meios públicos de informação: nem privados nem estatais.
Este artigo objetiva analisar os impactos da descentralização pós-1988 em distintas áreas de políticas públicas no federalismo brasileiro. Constata-se que a descentralização (político/administrativa/orçamentária), sobretudo em áreas como saúde, educação e transferência de renda, tem alterado as relações intergovernamentais e tem relevância política e acadêmica. No âmbito da institucionalização dos sistemas únicos e da unifi cação dos programas de transferência de renda, por exemplo, a União tende a se relacionar diretamente com as esferas municipais, reduzindo a participação da esfera estadual. Essa é uma mudança importante, uma vez que na institucionalidade clássica federativa os estados membros da federação vêm tornando-se coadjuvantes na produção das principais políticas sociais. Os diversos exemplos tratados pelo texto concluem que não se pode compreender o federalismo atual brasileiro numa única direção, mas que, a par disso, a tendente relação direta entre União e municípios produz impactos diversos no sistema político e nas políticas públicas.
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