A maioria dos estudos que se situam na perspectiva sócio-cultural e que aprofundam as relações entre factores sócio-culturais e cognição têm oscilado entre o estudo das práticas sociais, por um lado, e a mente ou o comportamento da criança, por outro lado.A minha preocupação, aquela que quero partilhar com vocês, é a situação da criança num mundo sócio-cultural, percebendo o sentido do seu lugar no mundo e tornando-se progressivamente um participante mais competente em acontecimentos sócio-culturais. E... as consequências cognitivas dessa participação.Vamos partir da hipótese de que existem, entre os primeiros anos de vida e o final do 1.º ciclo de escolaridade, três mudanças ao nível do sistema conceptual: 1) Uma, na organização pré--linguística baseada em actividades; 2) Outra, na organização convencional e popular, baseada no uso quotidiano da linguagem (e no significado lexical); 3) E, finalmente, uma outra num nível mais formal, teórico e adquirido pela instrução.A primeira transição envolve a conquista de um sistema que coordene um sistema primitivo baseado na experiência e na participação em acontecimentos com o sistema revelado pelo uso da linguagem. A segunda transição constrói-se no sistema cultural e transforma-o em termos de estruturas de conhecimento estabelecidas nas comunidades que definem os domínios de conhecimento formal.O nível intermédio é resultante do uso da linguagem no quotidiano, já existindo uma abstracção da realidade e uma organização geral do conhecimento de que são exemplo as taxonomias práticas: comida, roupas, animais e plantas (comida não é só o que se come ao almoço; animais não são só os que temos em casa). Estes são domínios organizados para servir fins culturais e conhecimento cultural, assim organizado, tende a existir em sistemas esquemáticos e resulta num conhecimento convencional organizado de forma idiossincrática.Neste nível, o uso da linguagem e a narração vão permitir reanalisar a experiência vivida e representá-la a um outro nível descontextualizado.A narrativa e a organização categorial são formas de ordenar a memória e o conhecimento, que não são específicos de qualquer domínio particular do conhecimento e vão ser fundamentais para que o conhecimento prático possa evoluir para um sistema de conhecimentos abstracto, teórico e formal.
INTRODUÇÃODesde os trabalhos de Mandler (1983) e Nelson (1985Nelson ( , 1986 que se tem consolidado a ideia da importância das estruturas esquemáticas na organização do conhecimento da criança. São múltiplos os trabalhos desenvolvidos no sentido de verificar empiricamente, a hipótese de que o conhecimento sobre acontecimentos se começa a organizar de forma esquemática.Os esquemas são estruturas representacionais que fornecem um conjunto organizado de expectativas sobre uma situação. Cenas, scripts e histórias são tipos de conhecimento esquematicamente organizado, que podem ser activadas em determinadas situações e guiar a compreensão, a acção e posterior recordação (Howard, 1987;Matta, 2000;Nelson, 1996;Nelson, 2000).A memória, tal como todas as funções psicológicas está sujeita a um processo de desenvolvimento de natureza sócio-cultural.Desde o primeiro ano de vida, que a criança vai construindo representações organizadas de situações rotineiras socialmente organizadas e, desde as primeiras palavras que começa a fazer referências ao passado. Este processo é claramente orientado pelo adulto, quer no seu conteú-do quer na sua organização . As crianças aprendem as formas e as funções de falar do passado pela participação em situações com outros que os orientam nesse processo (Bauer, Wenner & Kroupina, 2002;Reese, Haden & Fivush, 1993;Welch-Ross, 1997). Mas falar do passado e partilhar memórias exige uma recordação organizada e uma narrativa coerente com o acontecimento a relatar e o ponto de vista do outro (Labov, 1882; Peterson & McCabe, 1982;Lapsley, 1986) e uma das dificuldades da criança é precisamente como organizar a sua experiência pessoal numa narrativa coerente. É no decurso da interacção social com o adulto e com a sua ajuda, que a criança aprende a memorizar, organizar, avaliar e narrar as suas experiências.A linguagem vai possibilitar uma re-organização da experiência vivida, uma reconstrução a um nível simbólico de uma experiência agida. Um dos factores importantes para uma boa recordação e organização de uma acontecimento, reside na presença de relações causais e temporais entre os elementos (Bauer & Mandler, 1990). 155
scite is a Brooklyn-based organization that helps researchers better discover and understand research articles through Smart Citations–citations that display the context of the citation and describe whether the article provides supporting or contrasting evidence. scite is used by students and researchers from around the world and is funded in part by the National Science Foundation and the National Institute on Drug Abuse of the National Institutes of Health.
customersupport@researchsolutions.com
10624 S. Eastern Ave., Ste. A-614
Henderson, NV 89052, USA
This site is protected by reCAPTCHA and the Google Privacy Policy and Terms of Service apply.
Copyright © 2025 scite LLC. All rights reserved.
Made with 💙 for researchers
Part of the Research Solutions Family.