Quando Celso Furtado dedicou-se a escrever seu testemunho sobre as disputas políticas e econômicas das décadas de 1950 e 1960, caracterizou o período como uma fantasia que acabou sendo desfeita. Ele sugere, assim, que o otimismo e a esperança da época, em que a superação do subdesenvolvimento da economia brasileira parecia estar ao alcance da mão, tinham algo de ilusório, fantasioso. A ruptura brusca e violenta ocorrida em 1964, com o golpe civil-militar, desfez a fantasia, jogando luz sobre as tensões que vinham se acumulando até ali. Narrando sua partida para o exílio, Furtado (2014, p. 496) ressalta a força da desilusão: "Agora, essa fantasia estava desfeita, desmoronara como uma estrela que se estilhaça. Era como se uma enxurrada tudo houvesse arrastado".Ressalvadas as diferenças entre o período que o autor examina e o momento atual, a ideia de uma fantasia que se desfaz cai também como uma luva para descrever a brusca reversão de expectativas que se observou no Brasil sobretudo a partir de 2013 ou 2015, conforme o observador. Passou-se, em um intervalo curto de tempo, do otimismo para o desalento, do crescimento para o colapso econômico, da sensação de que os problemas estavam sendo superados para o sentimento de que não há saídas para a crise.Embora socialmente dramáticos, tais períodos de crise servem de estímulo à reflexão. Foi assim no final dos anos 1960, quando se elaborou uma série de revisões críticas das interpretações anteriores sobre a economia, a sociedade e a política brasileiras. Várias dessas revisões foram formuladas, aliás, no próprio Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e publicadas como Estudos Cebrap.Esse tipo de balanço crítico voltou a ser fundamental. A experiência dos últimos quinze anos, desde a chegada do Partido dos Trabalhadores (pt) à presidência até os colapsos tanto econômico quanto político atuais, precisa ser analisada em detalhe e sob diversos pontos de vista, para que suas lições sejam aprendidas. No calor do momento,