D ESDE A PUBLICAÇÃO de meu livro sobre a historia da Aids, as perguntas que médicos e leigos me colocam com mais freqüência dizem respeito às origens do flagelo: seria a Aids uma doença nova? Caso não seja, como então poderia permanecer despercebida? Caso seja, de onde veio o germe?Para responder a tais perguntas, eu quis primeiro elucidar o que significa exatamente a expressão doença nova. Nova por não ter sido conhecida antes ou por não ter existido? E, nesse caso, que quer dizer não existir? Estar ausente de vim lugar apenas e não se alastrar por determinada população humana, ou não existir em parte alguma do mundo, nem que seja entre os animais? Não se ter manifestado num passado imediato apenas, ou nunca ao longo da história toda? Por isso, pareceu-me necessário substituir a noção imprecisa de doença nova pela de doença emergente, cujo significado já esclareci e da qual, em artigo publicado em 1993, analisei os diferentes aspectos.Além disso, ao falar da emergência da Aids, convém distinguir claramente três problemas: a origem do germe, as primeiras manifestações da doença de forma esporádica e o início da epidemia. A emergência da Aids é um processo histórico que se desenvolve em três etapas sobrepostas, cada uma das quais desencadeada por causas particulares.Não há vírus patogênico totalmente novo. Nenhum deles surge ex nihilo. Ele vem de um ancestral que devia ter características genéticas vizinhas e perpetuava-se em algum lugar, numa população humana ou animal. Esse ancestral não era necessariamente patogênico, ou então muito pouco, em relação à população animal ou humana original.A pandemia, que hoje grassa, resulta da sobreposição de, pelo menos, duas epidemias diferentes, provocadas por dois germes distintos: HIV-1 e HIV-2. São parentes colaterais, pois as seqüências de seus genomas são tais que um não pode ser descendente do outro. A epidemia causada pelo HIV-2 teria, com certeza, passado despercebida se a gravidade da primeira não tivesse aguçado o olho clínico dos médicos e orientado as pesquisas dos virologistas. Essa segunda epidemia