Os conceitos antropológicos têm histórias de vida interessantes. Sendo antropológicos, espera-se que emirjam de uma relação de alteridade e que sirvam para pensar diferenças próprias desta relação. De sua emergência até sua estabilização, transmutam-se ao atravessar diferentes paradigmas, entram em relação com referentes díspares e com epistemes diversas, implicam variadas atitudes epistemológicas e políticas, sendo sempre de alguma maneira polissêmicos, o que faz deles entidades complexas e dignas de atenção.Porém, a vida dos conceitos não é como a das pessoas: eles não nascem, amadurecem, envelhecem e morrem numa linha cronológica irreversível. Potencialmente, conceitos têm vida eterna e, ao menos enquanto a filosofia e a ciência existirem como as entendemos, eles estarão sempre disponíveis (cf. Goldman 1994:24; Deleuze & Guattari 1997:14). Prova disto é a retomada de certos conceitos que pareceram mortos por anos para a antropologia, mas que reapareceram recontextualizados, como, por exemplo, o totemismo, que de "disposição contingente de elementos não específicos", foi feito operação classificatória por Lévi-Strauss (1980), ou o animismo, que de "doutrina geral das almas" em Tylor (1970) renova-se como "modo de identificação" ou "ontologia relacional", para Descola (2005), Ingold (2006) e outros.O foco do presente texto é a biografia de um conceito, fetiche, e consequentemente
Throughout the Guianas, people of all ethnicities fear one particular kind of demonic spirit. Called baccoo in Guyana, bakru in coastal Suriname, and bakulu or bakuu among Saamaka and Ndyuka Maroons in the interior, these demons offer personal wealth in exchange for human life. Based on multisited ethnography in Guyana and Suriname, this paper analyzes converging and diverging conceptions of the “same” spirit among several Afro- and Indo-Guianese populations. We argue that transformations in how people conceptualize bakulu reveal how supposedly radical moral differences are constructed within and between populations in the multi-ethnic Caribbean. More than figurative projections of monetized inequality or racial and ethnic prejudices, baccoo actively mediate how people throughout the Guianas think about and experience the everyday conduct of economic and racial relations.
Neste artigo de 1991, David Scott analisa importantes marcos da antropologia estadunidense acerca dos povos de ascendência africana no Novo Mundo: o trabalho de Melville Herskovits, nos anos 1920 a 1940, e o de Richard Price, nos anos 1970 e 1980 – dando ênfase às pesquisas de ambos entre os Saamaka do Suriname, que figuram como “uma espécie de metonímia antropológica” nas discussões sobre a diáspora africana nas Américas. Scott buscará compreender como a “ciência da cultura” fundada por Boas construiu “o Negro do Novo Mundo” como objeto teórico e passou a fornecer o vocabulário autorizado capaz de identificá-lo e de representá-lo. O autor tece críticas ao modo como tal antropologia constrói uma narrativa de continuidades entre memórias precisas no presente e os tropos “África” e “escravidão” em passados autênticos e verificáveis, para depois propor aquelas que considera serem as tarefas teóricas adequadas para o complexo campo discursivo da “tradição”.
A divisão entre dádivas e mercadorias está entre os pares de oposição que mais renderam páginas de discussão na antropologia. Já há algumas décadas, contribuições sobre o tema (Gregory 2015;Strathern 2006;Graeber 2001) marcam com veemência o caráter ficcional (ou analítico) da divisão, o que implica compreender que a oposição é um artifício do antropólogo, que imagina uma linguagem conceitual de escopo provisório, mas que serve a propósitos teóricos e políticos pertinentes nos limites da trama e coerentes com os dados empíricos relevantes (Strathern 2006:33; 2014:175). Separar dádivas de mercadorias ajuda a pensar diferenças significativas entre maneiras pelas quais diferentes povos pelo mundo levam a cabo atividades ditas econômicas: produção, distribuição, troca, consumo, reprodução (sendo o destacamento dessas atividades em um campo econômico uma operação igualmente ficcional ou analítica). Strathern, parafraseando Gregory, sintetiza: "pode-se imaginar esse eixo como uma diferença entre metáforas de base: se, numa economia mercantil, as pessoas e as coisas assumem a forma social de coisas, numa economia de dádivas elas assumem a forma social de pessoas " (2006:208).A separação entre "economias de dádivas" e "economias mercantis" arrisca gerar um grande divisor, clivar o mundo entre sociedades nas quais predomina o dom e aquelas nas quais predominam a mercadoria -o que significa, afinal, dividir o mundo entre o capitalismo característico do Ocidente moderno e todas as outras formas de vida. Entretanto, enfatizar o caráter ficcional da divisão é uma forma antropológica de reflexividade: de jogar o grande divisor contra ele mesmo, utilizar categorias criadas para estudar um "lado" no "outro" e assim subverter nosso entendimento sobre o que está "dentro" e "fora" do capitalismo.1 "Dádiva" e "mercadoria", conceitos sempre provisórios, explicam um ao outro, posto que não são, a priori, predicados inerentes aos objetos descritos, nem tampouco características monolíticas de sociedades onde predominam. Um mesmo objeto é capaz de transitar em circuitos de dádiva e capitalísticos, podendo ser lido ora como dom, ora como mercadoria (Appadurai 2008;Kopytoff 2008;Tsing 2013).
Conecto uma questão derivada da etnografia businenge a conceitos acerca da pós-colônia. Na língua saamaka, as principais catacreses que pareiam espaço e tempo colocam o futuro atrás e o passado na frente, porém, ao se referirem ao progresso, as figuras que utilizam são invertidas. Analiso tal duplicidade pensando o emaranhamento de temporalidades da época pós-colonial e a ideia de tradição como terreno de dissonância política e de construção ativa de relações entre passados e futuros.
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