Resumo As doenças genéticas raras constituem um importante problema de saúde pública, mas ainda são pouco estudadas na perspectiva da Saúde Coletiva. Este artigo tem por objetivo analisar os itinerários terapêuticos de pacientes com doenças genéticas raras nas cidades do Rio de Janeiro, Salvador e Porto Alegre, tendo por foco os desafios materiais, emocionais e estruturais enfrentados na busca por diagnóstico e tratamento. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com pacientes/cuidadores e profissionais de saúde em serviços públicos de genética médica. Observou-se que a experiência da doença genética rara, além de ser um desafio em si pelo caráter debilitante e incapacitante, é agravada por problemas de ordem prático-relacionais e burocrático-institucionais que não se resolvem com a chegada a um serviço especializado. A existência de longos itinerários terapêuticos até o diagnóstico, o desconhecimento dos médicos não geneticistas sobre as doenças raras, as dificuldades de transporte e de acesso a especialistas, a exames diagnósticos e complementares e o acesso a medicamentos e insumos alimentares de alto custo foram comuns às narrativas nas três cidades. A adesão aos cuidados oferecidos exigem estratégias de ação que dependem de arranjos envolvendo familiares, médicos, associações de pacientes e o Estado.
A Biologia e as ciências da vida tem refutado a raça enquanto categoria biológica para classificar seres humanos desde a declaração das raças da UNESCO que data dos anos 1950. Entretanto, categorias raciais continuam a ser utilizadas na prática médica, especialmente na investigação genômica. Nos primeiros estudos realizados depois do Projeto Genoma, no início do século XXI, a tecnologia genética tem se orientado principalmente para estudos de ancestralidade genômica, considerando que existem polimorfismos que distinguem diferentes populações, que estes polimorfismos são importantes para predizer certas condições genéticas em saúde e podem justificar a segregação os seres humanos em grupos discretos. De acordo com a genética médica, alguns destes polimorfismos expõem os indivíduos a especificidades biológicas e fisiológicas que devem ser consideradas no diagnóstico e no tratamento de saúde na perspectiva de prevenir disparidades em saúde. As controvérsias emergem quando discursos em torno de disparidades na biologia se conectam com as desigualdades em saúde como efeito do racismo, desafiando pesquisadores da área médica, profissionais de saúde, gestores de políticas públicas e os movimentos sociais a desnaturalizarem tais diferenças em suas práticas ao mesmo tempo em que contribuem para materializá-las. A partir do trabalho etnográfico realizado entre geneticistas, profissionais de saúde, gestores de saúde e movimentos sociais no sul do Brasil, este artigo traz algumas reflexões sobre as complexidades e controvérsias acerca dos processos científicos e políticos de classificação racial.
A notificação dos casos de covid-19, no Brasil, tem sido objeto de uma série de disputas, que vão desde a dificuldade de diagnóstico (devido à escassez de teste no início da pandemia), passando pelas dificuldades de atualização diária dos dados (face a demora dos resultados da testagem dos pacientes), até o levantamento de dados por raça/cor que é o objeto de atenção deste ensaio. Ao longo do texto exploro as disputas em torno da classificação racial dos pacientes pelos serviços de saúde, chamando a atenção para o maior rigor no emprego das categorias raciais nos diferentes contextos regionais, de modo que os dados sejam produzidos e interpretados, garantindo fidedignidade à realidade das diferentes populações atendidas, já que é a partir desses indicadores que se formulam políticas públicas para a mitigação das iniquidades em saúde.
O contexto pós-genômico tem sido marcado por um imaginário alimentado por promessas e esperanças abertas pelo mapeamento do genoma humano. A forma como os achados são veiculados nos meios de comunicação não especializados contribuem para expectativas de diagnósticos e intervenções cada vez mais precoces, como nos casos de terapias e edições gênicas ainda muito distantes, na prática. Intervenções em níveis moleculares que acenavam para a possibilidade de manipulação de fenótipos associados a sexo e raça captaram especialmente nossa atenção e tem mobilizado nossas pesquisas de doutorado por tocarem na questão da eugenia, uma das problemáticas éticas fundamentais na investigação genética. No presente artigo apresentamos algumas reflexões suscitadas pelas práticas e narrativas dos nossos interlocutores de pesquisa. A partir de distintas experiências de etnografias da genômica, nos aproximamos ao longo do texto nas reflexões sobre a forma como categorias políticas fundamentais de análise social como gênero e raça tem sido materializadas nas práticas da ciência não apenas discursivamente, mas ontologicamente produzindo novas anatomias.
O artigo discute como a raça é, em um primeiro movimento, rechaçada no campo biomédico enquanto categoria que não tem sentido para a prática em saúde. Contudo, na realidade concreta, torna-se uma presença-ausente que perpassa tanto as produções tecno-científicas quanto as atividades clínicas. A raça figura, assim, enquanto um efeito aparentemente inesperado das tecnologias biomédicas quando estas se revelam orientadas por um ideal branco que toma os corpos como universais.
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