Neste artigo, pretendo discutir um aspecto do controle das drogas que é secundário nos debates públicos que giram em torno da proibição. Da mesma forma que as convenções da ONU destacam que as drogas provocam dor e sofrimento por conta “toxicomania”, da “dependência química”, gerando o comércio ilícito e a violência do “tráfico”, as mesmas convenções admitem que as drogas também continuam “indispensáveis para o alívio da dor e do sofrimento”. Vou utilizar dados etnográficos que produzi nos Estados Unidos e no Brasil para discutir o uso terapêutico da maconha para o manejo do “alívio da dor e sofrimento”. Tendo em vista que os conceitos médicos e legais são construções políticas, utilizo os regulamentos normativos sobre o uso terapêutico da maconha – o brasileiro e o estadunidense – com o objetivo de vislumbrar o clima político e moral do momento histórico em que são atualizadas. Espero, assim, contribuir para a elaboração de uma “farmacopeia política”, em torno da maconha, considerando os textos normativos como uma maneira de observar como são instaurados os vínculos morais, biológicos, comerciais, etc, entre os seres humanos e a planta.