Resumo: Pretendo explorar neste artigo as relações entre os domínios da roça (koo) e da floresta (ka'a), importante oposição da cosmologia wajãpi (grupo Tupi que habita o estado do Amapá). Ka'a e koo, contudo, não se constituem como uma oposição fixa, mas antes como posições relacionais que se movem, nas quais a capoeira ocupa um papel fundamental. Algo que é evidenciado tanto numa dinâmica de ocupação territorial -por meio do cultivo de áreas de mata primária e o abandono dos roçados após a colheita -, quanto por meio das relações perspectivistas que movimentam as categorias de roça e floresta, plantas cultivadas e não-cultivadas, através de distintos sujeitos. Nesse contexto, compreender a dinâmica das relações entre floresta e roçado é fundamental para melhor refletir sobre como algumas famílias wajãpi entendem a atividade agrícola. Proponho essa reflexão estabelecendo um diálogo com ecologia histórica que aponta para a existência de florestas antropizadas, contexto em que a agricultura se apresenta como uma atividade central para a produção de biodiversidade.Palavras-chave: Wajãpi. Roças. Capoeiras e florestas. Florestas antropizadas. Agricultura indígena. Ontologias ameríndias.
Abstract:In this paper I intend to explore the relationship between the areas of garden (koo) and forest (ka'a), a major opposition in Wajãpi cosmology. The Wajãpi are a Tupi group located in the state of Amapá. In their cosmology the garden and forest do not constitute a fixed opposition, but represent relational positions that move into two directions: a dynamic of territorial occupation by cultivating areas of primary forest, followed by the abandoning of clearings after the harvest; and perspectival relationships that shift the categories of garden and forest, cultivated and non-cultivated, through different subjects. In this context, understanding the dynamics of the relationships between forest and cultivation is critical for a better comprehension of the Wajãpi perspective on agricultural activity. I propose a reflection that establishes a dialogue with historical ecology that points to the existence of anthropic forests. In this way, agriculture is presented as a central activity for the production of biodiversity and areas of anthropic forests.