Resumo: O Brasil não espantou totalmente todos os fantasmas de seu recente passado de regime de exceção. Ainda não houve o restabelecimento completo da normalidade democrática, não obstante a consagração dos princípios da democracia formal e do Estado democrático de direito. O país ainda não conseguiu levar, para parcelas importantes da população, os princípios de justiça, paz, desenvolvimento e equidade. O aparato estatal -particularmente polícia e justiça -ainda apresenta limitações em termos de controle social, transparência e efetividade. Diante de tantas incompletudes, enfrenta-se a escalada da violência, da criminalidade, do crime organizado e da desestrutura urbana. Como resposta aos problemas percebidos como urgentes, a jovem democracia brasileira apela para as instituições da segurança pública e, na falta e insuficiência destas, para as forças privadas de vigilância. As Forças Armadas, igualmente, são acionadas como garantidoras da ordem e da paz dentro do território e das comunidades. Estamos diante de uma tendência de militarização da segurança pública? Esta tendência é nova? Corresponde a que práticas e a que aspirações da sociedade brasileira globalizada? É o que se pretende discutir no presente artigo.Palavras-chave: segurança, polícia, Polícia Militar, militares, Forças Armadas.
IntroduçãoPer me si va nella città dolente, Per me si va nell'eterno dolore, Per me si va tra la perduta gente, [...] Lasciate ogni speranza, voi che entrate.
Dante Alighieri.E m agosto de 2010, o governo do presidente Lula sancionou lei que atribui poder de polícia às Forças Armadas. Os militares poderão fazer atividades policiais como revistar pessoas, veículos, embarcações, bem como deter pessoas consideradas suspeitas em áreas de fronteira. Forças militares brasileiras têm desempenhado papel na estabilização social e política do Haiti, presença reforçada em razão do terremoto que assolou o país em janeiro de 2010. Essas forças expedicionárias receberam treinamento de guerrilha e luta urbana nas favelas do Rio de Janeiro. A população urbana do país clama por intervenção militar nos morros e favelas dominados pelo tráfico de drogas e assolados pela violência de traficantes, milicianos e policiais. É importante notar que a privatização da segurança não é uma exceção à militarização, é, ao contrário, parte da tendência de disseminação das armas e do modelo da guerra ao inimigo interno, que envolve tanto o uso da força como