A epidemia de Covid-19 no Brasil já se constitui uma das mais impactantes questões de saúde pública na realidade do País e no mundo moderno, em decorrência das múltiplas consequências e tensões que atingem a nossa sociedade. Ainda que o foco esteja na proteção aos usuários e à comunidade, o cenário de epidemia no Brasil interferiu de forma abrupta no processo educacional da formação médica e de outros cursos da saúde, exigindo um remodelamento emergencial e demandando atenção e diálogo ágil entre educadores, gestores e sociedade. A preocupação com o impacto da epidemia na formação dos futuros médicos, está presente ao redor do mundo(1), com ênfase no desafio de adequação do processo formativo ao cenário de epidemia, em função da não integralização das cargas horárias preconizadas, do deslocamento das atividades previstas para alguns campos de prática diversos, da possibilidade e antecipação das formaturas e do uso adicional de tecnologias educacionais à distância, que podem impactar a execução do projeto pedagógico original dos cursos, bem como das próprias diretrizes curriculares nacionais.
No final de outubro deste ano, foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) o Decreto nº 10.530/2020 que instituiu a "política de fomento ao setor de atenção primária à saúde, para fins de elaboração de estudos de alternativas de parcerias com a iniciativa privada". Pelo documento, a ordenação do processo ficaria a cargo da Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos do Ministério da Economia. Poucos dias depois, a portaria foi revogada pelo governo federal, em uma espécie de recuo aparentemente em virtude da ampla repercussão (negativa) gerada. É fundamental a compreensão de que esse movimento não é um processo isolado de tentativa de privatização do Sistema Único de Saúde (SUS), mas a exacerbação de um desmantelamento histórico sofrido por ele. É preciso compreender esse movimento com atenção às outras políticas de austeridade que vêm precarizando a saúde e a vida do povo brasileiro. Na ponta dessa lança da privatização do SUS, está a Emenda Constitucional nº 95, aprovada em 15 de dezembro de 2016, que congela o limite de orçamento das despesas primárias por 20 anos e, naturalmente, fere o núcleo do direito à saúde. Esse recuo do governo federal não representa, em nenhum aspecto, uma mudança nos projetos ou nas iniciativas que constroem (ou destroem) o SUS, mas uma reação à opinião pública acerca do assunto e uma tentativa de manutenção de popularidade. Além disso, esse suposto recuo estratégico advém, sobretudo, de uma análise da reação dos seus aliados do governo e do mercado internacional. O momento exige grande atenção e organização, pois já se prometeu um novo projeto, reeditado, para os próximos meses. Provavelmente, seguindo a tendência de todos os movimentos dos últimos anos, não será uma vitória para o SUS. No momento em que este editorial está sendo redigido, o Brasil já ultrapassa 160 mil mortes pela pandemia da Covid-19, e esse número só não é maior em razão da consolidação (ainda que parcial) do SUS. Vale lembrar que cerca de 70% da população brasileira tem no SUS sua única forma de acesso ao cuidado e à assistência à saúde. Por isso, torna-se ainda mais preocupante a escolha de alguns líderes brasileiros: a de transformar a atual crise da pandemia em tragédia. No artigo 3º de seu Estatuto Social, a Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), em 58 anos de atividade em prol do desenvolvimento da educação médica no Brasil, destaca o seu compromisso em valorizar a formação de médicas e médicos capazes de atender às necessidades de saúde da população. Além disso, a Abem menciona um objetivo fundamental: contribuir para o fortalecimento do SUS e para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Com base nisso, entendemos que este é momento de reafirmar o nosso compromisso com a saúde pública e a educação de qualidade, e articular nossas ideias, nossas instituições e nossos movimentos na defesa do nosso SUS e, sobretudo, na consolidação do pleno direito à saúde para todo o povo brasileiro. Pelo SUS e para além dele!
Para nortear nossas considerações iniciamos pelos pressupostos que norteiam a Residência Médica desde seu reconhecimento: É uma formação de pós-graduação; É o padrão ouro das especialidades médicas; Caracteriza-se como um processo de ensino-aprendizagem em serviço; Exige a definição prévia de competências profissionais a serem alcançadas; O aprendizado deve ser supervisionado e regularmente avaliado pelo Preceptor; A remuneração, na modalidade bolsa de estudos, é essencial para sua existência; Todas as normativas que a regulam são de responsabilidade do Ministério da Educação. Seguimos com algumas considerações relacionadas ao momento da pandemia da COVID19: Trata-se de uma crise mundial, de origem sanitária, com repercussões complexas em todos os segmentos da sociedade; Devido a sua magnitude, a situação mundial globalizada e o contexto contemporâneo, não há referência no passado tardio que possa nos orientar; O processo de aprendizado durante os acontecimentos relacionados a pandemia é acelerado, intermitente, volátil e imprevisível; A complexidade de seus impactos e das respostas necessárias ao enfrentamento sinalizam para relações inéditas entre os segmentos da sociedade e as instâncias gestoras. Cabe destacar ainda o contexto no qual nosso País, e em especial a Residência Médica e seus cenários de atuação, se encontravam no momento de explosão da pandemia: Consolidação progressiva da compreensão do caráter educacional da Residência Médica no âmbito da Comissão Nacional de Residência Médica; Investimento de recursos humanos e técnicos na (re)definição de competências profissionais específicas para o alcance das metas de formação dos especialistas; Capilarização incipiente desta compreensão pedagógica e de seus frutos – a construção das matrizes de competência – entre as Comissões de Residência Médica (COREMEs), instâncias de coordenação dos programas; Indefinição de processo de avaliação educacional relacionado à formação com ênfase nas competências; Progressiva integração entre políticas públicas de responsabilidade interministerial, especialmente Ministério da Educação e Ministério da Saúde, visando a qualificação da Residência; Persistência de “vazios de especialistas” em regiões do país com respectivo incentivo financeiro do Ministério da Saúde para ampliação de vagas em locais e especialidades específicas – ações do Pro Residência; Investimento interministerial no desenvolvimento de competências técnicas, pedagógicas e de gestão de preceptores e supervisores; Defasagem significativa no valor da bolsa de estudos da Residência Médica;
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