O evento em torno do qual gravita o presente artigo é um estudo sistemático, numa perspectiva descritivo-interpretativista, de dois fenômenos situados na esfera da fonética/fonologia: trata-se da redução de ditongos, o verso, e da ditongação, o reverso. Fenômenos que já contam com razoável bibliografia para o português brasileiro no sincrônico contemporâneo, o artigo em causa pretende preencher uma lacuna e, ao mesmo tempo, dar alguma nova contribuição sobre esses aspectos, na medida em que lastrearão o referido estudo 290 documentos escritos ao longo do século XIX, no âmbito de uma irmandade negra, a Sociedade Protetora dos Desvalidos, fundada em 1832, por africanos, na cidade de Salvador/BA.
Fugiu ontem da casa do Sr. Savério Rodrigues Jordão, um escravo de nação de nome Augusto, cinqüenta anos de idade, alto, testa larga e bem barbeado. Sabe ler e escrever e é bem falante. É ótimo cozinheiro de forno e fogão. Quem o apreender e o levar a seu senhor será gratificado. (Diário de São Paulo de 12 de agosto de 1870).Gratifica-se com 100$000 a quem entregar a Estanislau de C. P. o escravo Inácio de 30 anos de idade, mais ou menos, bem preto, barbado, boa dentadura, rosto comprido, nariz afilado, altura regular, ladino, olhos avermelhados, gosta de tocar viola, sabe ler, é natural da Província da Bahia. (A Província de São Paulo de 15 de julho de 1879).Ressaltar, ao lado dos nomes e características físicas dos escravos, o fato de que sabiam ler ou escrever, ou, ainda, as duas habilidades, parece mostrar que, para a própria sociedade de então, havia, de certa forma, a consciência de que isso era raro, ou seja, diante do mar de analfabetismo em que estavam mergulhados os escravos, quando ocorriam casos excepcionais de algum que sabia ler e escrever, isso o individualizava perante seus pares e servia-lhe, por conseguinte, como marca identificadora.Se há indícios de que escravos se alfabetizassem -poucos, que se registre -e, como já se informou, provavelmente não pelos meios formais, quais teriam sido os caminhos percorridos por essa parcela da população que, de alguma maneira, conseguiu alguma habilidade na escrita e na leitura? Discutem-se, a seguir, algumas hipóteses. ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO DE ESCRAVOSUm provável caminho foi apontado pela historiadora Kátia Mattoso (1992), quando diz que a aprendizagem da leitura e da escrita, por parte de escravos, tenha, talvez, se efetuado na casa do senhor. Portanto, para uma reconstrução do caminho percorrido por escravos para se alfabetizarem, tem que ser levada em consideração a sua relação com as famílias dos senhores. Trata-se, como é óbvio, de percurso difícil de ser reconstruído, uma vez que essas relações, estabelecidas dentro dos casarios, não deixaram, quanto ao aspecto que se busca, registros em outros lugares da sociedade passada. Os estudos de história social, entretanto, parecem deixar claro que as relações mais 'afetuosas' entre os escravos e as famílias dos senhores tinham mais chances de se estreitar com os chamados escravos domésticos, ou seja, aqueles que 17 ocupavam lugares de trabalho dentro dos domicílios. Tais relações seriam mais raras com os escravos urbanos, uma vez que viviam a trabalhar nas ruas, em várias atividades comerciais, como ambulantes, carregadores etc., apenas repassando o ganho obtido ao seu dono, e também com os escravos rurais, porque as atividades agrícolas não possibilitavam contatos mais diretos entre eles e os senhores. Desse modo, dos grupos de escravos mencionados -os domésticos, os urbanos e os rurais -, foram os primeiros, talvez, os mais prováveis a estabelecer relações, além de trabalhistas, com a família do senhor. Mesmo os que se denominam como escravos domésticos não podem ser considerados como um todo homogêneo...
Mais uma realização do grupo de pesquisa PROHPOR (Programa para a História da Língua Portuguesa), Do Português Arcaico ao Português Brasileiro é a terceira coletânea realizada pelos especialistas do Departamento de Letras Vernáculas da Universidade Federal da Bahia, depois do sucesso de A Carta de Caminha: Testemunho Lingüístico de 1500 e O Português Quinhentista: Estudos Lingüísticos. Esta obra, organizada pelos ilustres pesquisadores da área, Américo Venâncio Lopes Machado Filho e Sônia Bastos Borba Costa, recobre estudos que vão do português arcaico e avançam ao português brasileiro contemporâneo, passando pelos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX, recuando, em alguns casos, ao latim.
RESUMO:O evento que moveu e em torno do qual gravita o presente artigo foi a localização de 13 textos escritos por escravos no Brasil do século XIX. Tornam esses documentos raros o fato de os estudos históricos frequentemente apontarem para a afirmação de que esses indivíduos, por circunstâncias histórico-sociais, não tiveram acesso ao letramento. Tais documentos foram editados nos moldes de uma edição semidiplomática, tentando manter, o mais que se pudesse, as suas características originais. Feita a edição, o artigo deriva para um estudo linguístico em que estarão em causa, sobretudo, fenômenos ligados à aquisição da escrita, a fenômenos meramente gráficos e a fenômenos gráfico-fônicos. PALAVRAS-CHAVE:Português brasileiro; textos de escravos; século XIX; análise linguística. "Tudo neste mundo tem o seu tempo; cada coisa tem sua ocasião."
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