Este trabalho é uma reflexão sobre a Teoria dos Atos de Fala, de J. L. Austin (1998; [1976]). Meu objetivo é oferecer uma interpretação feminista ao problema da relação entre linguagem e corpo. Para isso, baseio-me nas interpretações de Butler (1997; 1999), Derrida (1979; 1990) e Rajagopalan (1989; 1990; 1992; 1996) que se referem ao trabalho de Austin. Discuto que a impossibilidade do controle intencional do ato de fala exclui a unicidade própria à idéia de "efeito mental" e desloca os limites da ação do ato de fala para além da ilocução - para o campo controverso do corpo que fala. O sujeito que fala é aquele que produz um ato corporalmente; o ato de fala exige o corpo. A presença material e simbólica do corpo na execução do ato é uma marca que se impõe no efeito lingüístico. O corpo, como elemento regulado pelas convenções ritualizadas nele inscritas, e performativizado pelo ato que postula sua significação prévia, impede a redução da análise do ato de fala à análise simples das convenções lingüísticas, e exige levar em conta a integralidade da materialidade do corpo que produz o ato. Palavras chave: performatividade; atos de fala; corpo; J. L. Austin; teoria feminista.
Resumo: As contradições entre discursos hegemônicos sobre língua no Brasil e práticas identitárias contemporâneas são o centro deste trabalho. Para debater este amplo tema, argumento que atos de fala reiterados têm construído hegemonias sobre língua no Brasil, sendo as principais a unidade linguística, a hierarquia escrita/ oralidade e a correspondência linear língua/escrita/cognição. Essas hegemonias remetem a três modelos interpretativos da Modernidade colonial. Tais modelos dependem fortemente da concepção moderna de identidade uniforme e bem delimitada, que o sistema mundo/moderno não suporta mais da mesma forma. As práticas identitárias contemporâneas dão suporte para duas contradições dos discursos hegemônicos sobre língua no Brasil. A primeira contradição é operada por mudanças de projeto do sistema mundo/moderno/colonial; a segunda contradição é operada pela silenciosa e anônima perseverança do projeto moderno. O que se conclui é uma síntese paradoxal: os discursos hegemônicos sobre língua no Brasil, herdados da Modernidade colonial, enfrentam atualmente, nas práticas identitárias contemporâneas, forças contrárias à sua estabilização, ao mesmo tempo em que a diferença colonial persiste.
Este artigo parte de uma observação situada do presente e de algumas indagações acerca das possibilidades e limites da transmissão de um ideário - princípios, valores, metodologias, saberes, etc. - através do tempo. O feminismo, enquanto um movimento político coletivo, cujas demandas por reconhecimento e legitimação pressupõem estratégias de formação contínuas, enfrenta, de tempos em tempos, impasses que estão relacionados à sua existência no presente e continuidade no futuro. O artigo pretende problematizar conceitos e questões em torno do "envelhecimento" das gerações que deram sustentação à política feminista a partir da redemocratização, no Brasil, ao final dos anos 1970, constituindo, no País, o legado da chamada "segunda onda". Nossa perspectiva busca interrogar sobre os processos de mudança social, contingentes e necessários a uma política de "transmissão" e formação de novas gerações.
Loco moção Loco moção Loco moção Loco moção Loco moçãoO calor do deserto era opressivo. 1 Em volta da boca, narinas e olhos, a presença irritante de moscas. É o ano de 1896. Baldwin Spencer e Frank Gillen estavam acampados logo ao oeste de Alice Springs, na Austrália. Gillen tinha convidado homens e mulheres aranda e seus vizinhos aborígenes para se reunirem não muito longe de lá para realizarem uma representação do repertório de seus rituais em troca de comida, tabaco, chá e proteção contra criadores de gado e polícia. Baldwin Spencer é um zoólogo, [mas] uma pessoa se torna [uma mulher] para tornar-se[desfeita] novamente.1 Artigo traduzido por Joana Plaza Pinto, da Universidade Federal de Goiás. Foi publicado pela primeira vez em francês na revista Anthropologie et Sociétés, v. 23, n. 3, 1999, p. 121-147, e traduzido de texto inédito em inglês por Michelle Mauffette. Uma versão condensada em inglês foi publicada na coletânea Language, Culture, and Society, organizada 206 Estudos Feministas, Florianópolis, 24(1): 205-237, janeiro-abril/2016 ELIZABETH A. POVINELLI Frank Gillen um telegrafista. Os dois homens aspiram tornarem-se líderes intelectuais da antropologia australiana nascente. Por isso, todos os dias, eles tiram fotos, rabiscam notas, sentam perto dos velhos Aranda -de nomes atualmente desconhecidos -, que, por sua vez sentados, lutam para responder à enxurrada de perguntas que Spencer e Gillen despejam neles sobre as cerimônias realizadas. Spencer e Gillen estavam felizes em suar, inalar moscas, esticar uma perna com câimbras. Eles conheciam a natureza inédita do espetáculo que testemunhavam. Diante deles se desenrolava sem dúvida o corpus inteiro da cultura masculina do deserto central. A partir dessas performances, Spencer e Gillen iriam publicar em 1899 uma obra etnográfica que se tornaria a pedra angular da geração seguinte de antropólogos aspirantes. 2 Em alguns momentos, Spencer e Gillen devem ter desviado os olhos de sua escrita e voltado o olhar para os abdomens distendidos das crianças e para as costas devastadas pelo chumbo grosso de homens e mulheres aranda. Quando Spencer colocou no chão seus gizes de cera para ajudar seus informantes aranda a traçar suas genealogias, ele deve ter ouvido histórias completas ou fragmentadas de epidemias, de envenenamentos e dos massacres que explicavam por que tantas árvores genealógicas aranda apresentavam ramos sem continuidade. Mas The native tribes of Central Australia não se interessa por esses corpos escandalosamente maltratados. A obra se preocupa muito mais com aquilo que seus autores e a jovem nação australiana de colonos consideravam como o escândalo moral das práticas rituais aborígenes. O texto faz eco à ansiedade pública a respeito da verdade secreta das corroborees, cuja menção era feita por todo tipo de textos midiáticos: jornais, memoriais populares da vida de colonizadores, etnografias amadoras. As corroborees, festas sagradas dos homens, incluíam sexo grupal. Sim, Spencer e Gillen escrevem, é verdade.Licença considerável é dada em...
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