O texto problematiza as competências gerais da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) enquanto articuladoras do governo da população brasileira pelas vias educacionais, operacionalizada por uma racionalidade neoliberal. Entende-se, através da analítica de Michel Foucault, que esse documento, enquanto estabelece uma regulamentação à organização curricular do sistema educacional no Brasil, conduz, igualmente, a forma como se constituem os sujeitos que acessam as escolas. Tais processos se desenvolvem através da produção discursiva do próprio documento, compreendido neste texto como um dispositivo de segurança. Almeja-se mostrar como as práticas discursivas veiculadas pela BNCC objetivam produzir sujeitos que assimilarão os preceitos neoliberais como um modo de vida, empreendedores de si, aprendizes permanentes e competitivos. Com a publicação da BNCC, em 2017, a educação no Brasil se vincula a uma política contemporânea de estreitamento entre a educação brasileira e o corolário neoliberal do empresariamento social. A BNCC não deve ser analisada como um documento que se refere apenas aos sujeitos escolares – docentes e discentes; mas sim, enquanto imbricada em relações de poder e de produção de subjetividades, precisa ser entendida como um elemento estratégico na regulação das condutas sociais. Assim é que a governamentalidade neoliberal é entendida como um modo de ser, um ethos, que tem nas competências gerais da BNCC um dispositivo fundamental para a disseminação do modelo empresa como princípio de funcionamento de toda sociedade.
Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijos sobre o batel; e Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram. […] A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem-feitos [Carta de Pero Vaz de Caminha, 1500].
Resumo: O artigo analisa, a partir das considerações sobre biopolítica de Michel Foucault e Giorgio Agamben, a construção da população negra como população-sacer no contexto de emergência da chamada ideologia da democracia racial no Brasil na primeira metade do século XX. Problematiza a democracia racial enquanto dispositivo biopolítico a partir do qual o corpo-espécie da população é constituído considerando os princípios eugenistas que propõem a inclusão-exclusiva da população negra na construção da narrativa identitária nacional, bem como problematiza a miscigenação como estruturante da eugenia nacional no período. Destaca, nos anos 1930, a efetiva emergência da biopolítica no Brasil, chamando a atenção para os saberes estatísticos no processo de formação do corpo-espécie da população, desdobrado da política de branqueamento e da neutralização do racismo, traduzidos na democracia racial como elemento constitutivo da nacionalidade brasileira. A democracia racial se institui como elemento fundamental da narrativa identitária nacional a partir da qual não somente se nega o racismo, mas se mobilizam estratégias de branqueamento da população em que os processos de subjetivação étnico-raciais são contornados pela dinâmica da mestiçagem. Um dos desdobramentos desta dinâmica da mestiçagem foi a "pardificação" da população, como fica evidente nos censos a partir dos anos 1940.Palavras-chave: democracia racial, população-sacer, biopolítica, eugenia, história. IntroduçãoE ste texto propõe discutir, apoiado nas considerações de Michel Foucault e Giorgio Agamben, sobre biopolítica, a racionalidade a partir da qual a população negra foi constituída como sacer no processo de construção da chamada "ideologia da democracia racial" no Brasil, na primeira metade do século XX. A "democracia racial" é entenedida como o arranjo político -ou melhor, biopolítico -desdobrado das estratégias eugenistas que sustentaram o projeto de branqueamento da população brasileira no contexto da pós-abolição, promovendo um processo de inclusão-exclusiva do negro na constituição do corpo-espécie da população. O que problematizo, neste caso, é como foi fundada a racionalidade a partir da qual a população negra foi construída como sacer, abarcada num processo que a institui para fazê-la "desaparecer".Para dar conta da problemática proposta, o artigo está dividido em duas seções. Na primeira, intitulada "Biopolítica e vida nua", teço algumas considerações sobre biopolítica e Homo sacer (zoé, vida nua), articulando o pensamento de Michel Fou-
scite is a Brooklyn-based organization that helps researchers better discover and understand research articles through Smart Citations–citations that display the context of the citation and describe whether the article provides supporting or contrasting evidence. scite is used by students and researchers from around the world and is funded in part by the National Science Foundation and the National Institute on Drug Abuse of the National Institutes of Health.
customersupport@researchsolutions.com
10624 S. Eastern Ave., Ste. A-614
Henderson, NV 89052, USA
This site is protected by reCAPTCHA and the Google Privacy Policy and Terms of Service apply.
Copyright © 2024 scite LLC. All rights reserved.
Made with 💙 for researchers
Part of the Research Solutions Family.