Resumo Em 1997, dez anos após o Desastre Radiológico de Goiânia, um grupo de policiais militares (PM’s) que trabalharam nas áreas contaminadas pelo césio-137 reivindicam como causa de seus distúrbios físicos e psicológicos o contato que tiveram com a radiação em 1987. Este trabalho, através das representações construídas sobre a noção de corpo contaminado e das experiências cotidianas vividas por PM’s em confronto com autoridades governamentais, militares, médicas e parlamentares, analisa a emergência do conceito de doença de radiação e a construção da noção de resistência em situação de desastre. Indo além do pressuposto foucaultiano de que a biomedicina articula formas de poder e controle sobre os corpos, suas percepções e tratamentos, eu discuto como as experiências de resistência destes policiais, através do uso simbólico do corpo, engendram novas formas de conceptualização do “corpo político”.
The 1987 radioactive disaster in Goiânia -a 'critical event' -revealed the for- ResumoO desastre radioativo de Goiânia -um "evento crítico" -expôs a formação de novas identidades sociais que se opuseram à configuração de "radioacidentados", uma classificação estabelecida pelo sistema perito nuclear e definida exclusivamente pelas altas doses de radiação. Na procura pelo sentido da doença e do sofrimento, percebidos como causados pelo desastre, novos
Neste artigo analisamos as representações sociais articuladas pelos grafismos aplicados nas bonecas karajá a partir do entendimento de que a cultura material está inserida em contextos sócio-ecológico-territoriais e imbricada nas dinâmicas de poder que envolvem sua produção, significação e circulação. A análise é feita a partir dos dados levantados na pesquisa coletiva que subsidiou o registro do modo de fazer e formas de expressão das Ritxoko como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. A pintura dos grafismos integra o processo de fabricação das figuras em cerâmica pelas mulheres, articula o mundo simbólico karajá e revela igualmente um processo criativo próprio, decorrente de fatores exógenos como aqueles imputados pelo contato interétnico. Nesse sentido, as ceramistas são classificadas internamente como "boas ceramistas" a partir de categorias que interligam arte, relações de gênero, saber tradicional, inovação e prestígio.
This article analyses the social representations of graphisms on Karajá dolls based on the idea that material culture is embedded in socio-ecological-territories contexts and interconnected to the dynamics of power involved within its production, meaning and circulation. The study is based on the data collected by a research group which informed the registry of "how to do" and "the expression forms" of the Ritxoko as Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. The graphisms drawing is a phase of the fabrication of ceramic dolls by women which articulates Karajá symbolic world as well as unveils a singular creative process coming up from external factors as the inter-ethnical contact. From this standpoint, the ceramists are classified by the members of their group as "good ceramists" based on categories that merge art, gender relationships, traditional knowledge, creativity and prestige
Este texto focaliza o desastre radioativo de Goiânia, Brasil, a partir das narrativas enunciadas, em 2004, por jovens que vivenciaram a catástrofe, em 1987, enquanto crianças. A pesquisa foi motivada pela constatação, através do trabalho de campo realizado ao longo das últimas décadas, que estes jovens ocultavam no cenário público o pertencimento do desastre. Desta forma, em contexto em que as lembranças configuram a memória traumática e instituem uma persona césio, problematizo o silêncio como uma forma de agencia. Argumento também que a compreensão dos impactos sociais e emocionais de um evento crítico demanda uma reflexão sobre as situações de vulnerabilidade social dos grupos envolvidos entre as quais aquelas engendradas pela geração. Palabras claves:Trauma e Agência; Narrativas e Radiação; Memórias Traumáticas; Sofrimento Social; Política da MemóriaThe text focuses on the Goiânia radiological disaster from the point of view of young people's narratives, expressed in 2004, about their experiences as children back in 1987. The research draws on observations made in long term fieldwork with these young people as they hid their identities as disaster victims in the public sphere. Hence, in contexts in which the remembrances configure traumatic memory from this disaster and engender the cesium persona, I argue that their silence is a form of agency. I sustain as well that the understanding of the social and emotional impacts of a critical event implies taking into consideration the situation of social vulnerabilities of the people affected, including those which are produced over generations.Keywords: Agency and Trauma; Radiation Narratives; Traumatic Memories; Social Suffering; Politics of Memory Introdução: Os caminhos que me levaram a ouvir os jovens do desastre de Goiânia O desastre radioativo com o césio-137 ocorrido na cidade de Goiânia, Brasil (Figuras 1 e 2), situado oficialmente em 1987, tem sido objeto de minhas reflexões, preocupações e emoções nos últimos vinte e nove anos. Como moradora dessa cidade em fins dos anos oitenta do século passado fui, desde o início, impactada pelas informações veiculadas pela mídia sobre a radiação que se espalhou por setores da capital do estado de Goiás em decorrência da liberação de 17 gramas de césio-137 provenientes da abertura de um aparelho radioterápico (Ciência Hoje 1988: 14). Este equipamento, abandonado pelos então proprietários do Instituto Goiano de Radioterapia (IGR), foi coletado, desmantelado por catadores de papel que posteriormente comercializaram suas partes e distribuíram o 'pó de césio' entre parentes e amigos. Quatro pessoas morreram nos dias subsequentes ao desmantelamento deste aparelho usado para o tratamento de câncer e duzentas e quarenta e nove foram consideradas contaminadas segundo relatórios publicados pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA 1988). Nomeadas de radioacidentados pelo sistema biomédico-nuclear, e de vítimas diretas pela Associação das Vítimas do Césio-137 (Silva 1...
Le conflit d’interprétation, associé aux aspects de la santé, de la contamination radioactive et des indemnisations, est toujours d’actualité dans le monde. Dans cette analyse, l’auteure avance que les expériences subjectives apportées par les récits construits par les survivants du désastre de Goiânia, au Brésil, défient les identités et les frontières définies par la biomédecine pour encadrer cette catastrophe.
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