ResumoO objetivo do artigo é analisar a confiança nas instituições democráticas (executivas, representativas e de justiça) com base em experiências traumáticas (como a vitimização por crime), controlando-se pelo enraizamento da cultura democrática (preferência pela democracia). Busca-se responder se, nas democracias antigas, com cultura cívica institucionalizada, indivíduos adquirem reserva afetiva ao regime e, assim, a vitimização por crime levaria à responsabilização apenas das agências diretamente envolvidas com a temática, isentando as demais. Nas novas democracias, ao contrário, o efeito de contaminação implicaria a redução da confiança nas instituições em geral. Para tanto, dados de 2010 referentes aos Estados Unidos da América (democracia antiga) e ao Brasil (democracia recente), do Latin American Public Opinion Project (Lapop), são tomados como contraponto empírico. Os resultados demonstram que a perda de confiança nas instituições em virtude da vitimização por crime é semelhante nos dois países, com a presença do efeito de contaminação um pouco maior no Brasil que nos Estados Unidos da América, mesmo quando os resultados são controlados pela preferência pela democracia. I. Introdução * D e que forma a vitimização por crime afeta as atitudes que os cidadãos têm em face das instituições da democracia (confiança nas agências executivas, representativas e de justiça) em cenários diferenciados de institucionalização do regime político (democracias antiga e recente)? Para responder a essa pergunta, importou-se da Ciência Política a discussão sobre os elementos que viabilizam a classificação de um país como democrático, bem como as características que permitem identificar a cultura política como cívica, tendo em vista o grau de confiança dos indivíduos nas instituições do regime. Da Sociologia, trouxe-se o debate acerca das consequências comportamentais que a vitimização por crime pode ocasionar na vida dos cidadãos em termos de interação com as instituições sociais.Para comparar os efeitos da vitimização por crime na confiança nas instituições democráticas, partiu-se da categorização de Dahl (2004) de democracias antigas e recentes. Afinal, toda a literatura da área atesta que a confiança nas instituições é mais resiliente no primeiro contexto que no segundo, em razão do aprofundamento da cultura política cívica. As democracias antigas existem continuadamente desde 1950 (ou antes), ao passo que as democracias recentes funcionam de forma ininterrupta há poucas décadas. A democracia antiga é representada, neste artigo, pelos Estados Unidos da América (EUA), que contariam com uma cultura cívica mais internalizada pelos cidadãos e, portanto, com mais afeição às instituições do regime. A democracia recente é a brasileira, em que a cultura democrática seria menos enraizada, visto que a transição do autoritarismo para esse regime se completou há apenas 30 anos, desde 1985.